segunda-feira, 27 de abril de 2009

O Dragão de Uffington - Parte 1


Fevereiro de 1610. Jérôme e Elena viajam por Ridgeway Path que liga Londres às terras campestres de Wessex Downs, a oeste. A viagem é calma e idílica, com montes e planícies verdejantes, campos cultivados e pequenas aldeias.

Ao cair da noite do segundo dia de viagem, Jérôme e Elena deparam com uma estranha cena: um grupo de homens, armados e com archotes, observa uma rapariga atada a uma estaca. Perante esta situação bizarra, temendo o pior, os dois heróis aproximam-se. Ao seu encontro vem um dos homens, armado com um mosquete que lhes exorta que prossiga caminha para evitar derramamente de sangue. Elena não se deixa intimidar por estas palavras e avança resoluta. O homem aponta o mosquete e dispara mas a bala acerta no chão ao lado de Elena que continua a avançar. O homem grita por ajuda.

O grupo de seis junta-se ao homem do mosquete. Dois ficam para trás para impedir que alguém se aproxime da rapariga. Os outros quatro, dois armados com pistolas e dois com facas, socorrem o homem do mosquete. Jérôme desembainha uma espada e saca de uma pistola. Corre para os homens. Dois dos meliantes disparam contra os heróis, mas falham. Jérôme, certeiro, dispara e deita o homem do mosquete por terra. Atrapalhados, os homens das pistolas começam a recarregá-las mas Jérôme não lhes dá tréguas. Com um golpe de espada desorienta um deles. Os restantes atacam Elena, julgando porventura que uma mulher é o elo mais fraco, mas enganam-se. A jovem atira-se contra um deles e derruba-o. Quase instantaneamente levanta-se, empurra o archote de um contra a cara de outro, assustando-os e fazendo-os baixar as suas defesas. Felizmente para os dois heróis, um dos homens com a pistola não dispara contra a refrega, temendo acertar nos seus companheiros. O outro, ainda desorientado, afasta-se, tentando recarregar a pistola atabalhoadamente. Elena trespassa aquele que está deitado e ataca os seus outros oponentes. Um golpe de lâmina e um terceiro cai, soltando um grito. Perante adversário tão experientes, os restantes fogem.

Os dois heróis apressam-se a libertar a rapariga. Mas, com grande supresa, ela corre chorando histericamente para o homem do mosquete prostrado. Para seu espanto, Jérôme e Elena apercebem-se que o homem é o pai da rapariga. Apesar de tremendamente agradecida, ela teme que os heróis tenham feito mais mal que bem pois agora o dragão não pode ser apaziguado. Dragão! A palavra despoleta nos heróis as mais vívidas imagens de terror mas também de aventura. Um dragão que aterroriza as aldeias naquela região. Curiosos, eles questionam a rapariga sobre o dragão e o porquê de toda aquela cena que acabaram de testemunhar.

A rapariga, chamada Martha, conta que há muitos anos atrás, um dragão aterrorizava aquela região. Os habitantes locais decidiram então sacrificar todos os anos uma rapariga cuja virtude ainda estivesse intacta. Com o tempo, e porque o dragão deixou de incomodar os habirantes locais a troco de um sacrifício, as pessoas começaram a voltar as costas à fé católica e a venerar o dragão. Um padre, horrorizado com tamanha blasfémia, viajou até à região vindo de longe e defrontou o dragão matando-o. O sangue da besta caiu no chão e formou a figura branca nos montes. Muitos anos decorreram até que há umas semanas as colheitas apareceram queimadas e pisadas como se por uma besta gigante. Começaram a correr rumores que o dragão estava a despertar. A figura branca começou a ficar manchada de sangue, sinal de que aquele líquido corria de novo nas veias do monstro. Temendo o pior, os aldeãos começaram a falar em sacrifícios, não sem antes um padre local, à imagem do que sucedera no passado, ter decidido defrontar o animal. O homem desapareceu sem deixar rasto. Foi então que decidiram tirar à sorte e sacrificar uma rapariga pura. A má sorte calhou a Martha e, apesar do pai ficar pesaroso, decidiu aceitar o destino da filha para um bem maior.

Jérôme sentiu-se particularmente abalado. Ele que jurara defender os fracos e oprimidos vira a sua lâmina ceifar a vida de inocentes. Embora estes homens o tivessem atacado, tinham agido por medo e não por má fé ou ódio. Com o coração pesaroso decide redimir-se ajudando os aldeãos a defrontar o dragão. Os três regressam à aldeia com intenção de voltarem mais tarde para trazer os corpos e dar-lhes um enterro cristão.

Mas eis que quando se aproximam da aldeia de Uffington, são recebidos por uma multidão enfurecida. Os sobreviventes do combate regressaram à aldeia e contaram como os heróis impediram o sacrifício. Temendo pelo pior, decidem oferecer Jérôme, Elena e Martha ao dragão. Mas Elena faz-se ouvir sobre a turba. Eles estão ali para defrontar o dragão, grita, e tudo farão para matar a criatura. Os aldeãos detêm-se, sem saber em que acreditar. Nesse mesmo instante, um longínquo ribombar ecoa nos montes. Parece um trovão ou um rugido de algo gigantesco. É o dragão, gritam! À distância vêem uma aura laranja aproximando-se. O dragão cospe fogo! Jérôme e Elena apertam os punhos das suas espadas. O som aumenta até que distinguem o som de muitos cascos de cavalos. No cume de um monte surgem as silhuetas de cavaleiros que param e observam a multidão.

Um dos aldeãos corre até aos cavaleiros. Os heróis não conseguem ouvir a troca de palavras mas apercebem-se que o rosto do cavaleiro se transtorna e fica vermelho de raiva. Inesperadamente, o cavaleiro ergue a mão e esbofeteia o aldeão. Em seguida, troteia até perto dos heróis e desmonta. Com uma grande vénia, apresenta-se como sendo Richard Vane, fidalgo e senhor das terras em redor. Tem um porte altivo mas a sua face esquerda está deformada por cicatrizes profundas. Pede desculpa pelas superstições idiotas dos aldeãos mas não existe dragão algum. Preza as acções dos heróis por terem salvo Martha e demonstra grande preocupação pelo bem-estar dela. Dito isto, ordena aos aldeãos que alberguem os heróis por esta noite e espera que amanhã partam pacificamente.

Elena interrompe-o rudemente. Ela está aqui para matar o dragão e não pretende partir sem esclarecer este caso. Jérôme sente alguma imprudência por parte da sua companheira e, temendo que ela insulte a hospitalidade do fidalgo, tenta interrompê-la mas a rapariga parece decidida. Richard esboça um sorriso. A sua face deformada parece adquirir contornos malévolos, ou será apenas impressão? Educamente, lembra a Elena que ele é senhor daquelas terras e não pretende que nada perturbe a ordem. A sua voz assume um tom ameaçador subtil. Antes que os heróis possam responder, vira as costas, monta no cavalo e parte com os seus companheiros.

Elena e Jérôme recolhem-se na estalagem na companhia dos aldeãos. Teimosamente, a rapariga insiste em saber mais sobre o dragão. Onde está? Quem o viu? Um dos aldeãos responde que uma noite voltava do campo com as ovelhas quando viu a criatura junto aos campos cultivados a queimar as colheitas. Nunca a viu claramente mas era o dragão de certeza. Recentemente as ovelhas têm desaparecido, provavelmente devoradas pelo dragão. Só têm sido encontrados restos de sangue. Quanto ao dragão de antanho, foi morto por um padre em Dragon Hill, nos montes. Foi quando caiu e o sangue criou a figura de branco.

Por alguma razão, Elena suspeita de Richard apesar de sem grande fundamento. Os aldeãos dizem-lhe apenas que Richard ficou desfigurado ainda jovem como resultado de queimaduras. Regressou há uns meses atrás para a mansão senhorial que é da sua família, após a morte do pai, na companhia de personagens pouco recomendáveis.

Elena decide então iniciar a sua investigação imediatamente. Apesar de Jérôme lhe chamar a atenção que a noite é escura e fria, Elena faz orelhas moucas e sai impacientemente. Sem outra alternativa, Jérôme decide acompanhá-la. Regressando ao local onde horas antes tinham defrontado os aldeãos e salvo Martha, os dois heróis examinam a figura de branco. De facto, os traços brancos estão manchados de sangue sustentando os medos dos aldeãos que o dragão está a voltar de novo à vida. Mas Elena não se deixa persuadir. Algo dentro dela a impele mesmo sem entender os seus actos, uma certa teimosia.

Ali perto estende-se uma pequena garganta. A descida é acidentada, mas a jovem usa toda a sua perícia para conduzir Jérôme até ao fundo coberto de tojos cujas flores amarelas, na escuridão, iluminadas apenas pelas lanternas, adquirem um tom pálido e doentio. Procurando por entre os arbustos, os heróis descobrem uma ovelha. O animal apresenta sinais de uma enorme queda. As pernas estão partidas e algumas costelas rasgaram a carne deixando as vísceras expostas, mas o mais estranho é que o animal foi degolado com uma faca ou espada. Indecisos quanto ao significado desta pista, os dois heróis decidem retirar-se para a aldeia e voltar no dia seguinte, ao raiar do dia quando poderão investigar melhor o local à luz do dia.

Capítulo seguinte: O Dragão de Uffington, parte 2.

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